sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

quinta-feira, 13 de maio de 2021

JOHN RAWLS («A Teoria da Justiça como Equidade») | A tua Filosofia


A cultura americana não nos legou apenas donuts e wrestling – de modo obviamente menos relevante, há pessoas nos Estados Unidos da América a dedicar-se à filosofia; tal como Rawls, os filósofos acima referidos são americanos.

Robert Nozick iniciou as suas funções docentes em Harvard três anos depois de Rawls; e foi também três anos depois de Rawls ter publicado, em 1971, a sua obra “Uma Teoria da Justiça”, que Nozick lançou “Anarquia, Estado e Utopia” (felizmente, o lançamento, efetuado através de uma janela, não magoou ninguém, apesar do livro ser pesado). De acordo com Nozick, o princípio da diferença viola o prioritário princípio da liberdade. Garantir que as diferenças económicas funcionam ao serviço dos mais desfavorecidos exige, é certo, um Estado que redistribui a riqueza, cobrando mais impostos aos mais ricos para assegurar os direitos sociais dos mais desfavorecidos. Ora, para Nozick, essa cobrança de impostos, feita contra a vontade das pessoas, viola o seu legítimo direito à propriedade, uma das liberdades fundamentais; os impostos sobre o trabalho que visam redistribuir a riqueza são, portanto, como trabalho forçado. Enquanto que a perspetiva de Rawls conduz à defesa de um Estado Social, Nozick defende um Estado Mínimo: um estado que não tem funções sociais como saúde ou educação, assegurando apenas a paz social e o cumprimento dos contratos. O Estado Mínimo tem militares, polícias e tribunais – não tem assistentes sociais, professores e bibliotecários. Nozick pertence, pois, a uma corrente ultraliberal que considera a liberdade individual o único valor a defender: o libertarismo (não confundir com o libertismo, tese no domínio da discussão, diferente desta, sobre o livre-arbítrio). Para os libertaristas, apenas princípio da Liberdade e o da Igualdade de oportunidades defendido por Rawls, importa.

[ UPDATE: ligação para o vídeo da série "versus e critiquinhas" sobre a crítica de Nozick: https://www.youtube.com/watch?v=FbKBW... ]

Michael Sandel começou a ensinar em Harvard - bastante jovem - aproximadamente vinte anos depois de Rawls (e contou numa entrevista como recebeu, nos primeiros dias, um amigável telefonema de Rawls, que contudo o deixou nervoso pela magnitude do filósofo). Em 1981, dez anos depois da principal obra de Rawls, Sandel (talvez equipado com umas belas sandálias) publicou “O liberalismo e a esfera da justiça”. Diferentemente da matriz kantiana do pensamento de Rawls, cuja posição original com véu de ignorância concebe, ainda que hipoteticamente, as pessoas como agentes somente racionais, dando prioridade ao justo face a conceções particulares do bem, Sandel vai afirmar que tal metodologia é infrutífera. Não há pessoas assim concebidas e não vale a pena pensar assim, ainda que hipoteticamente. O comunitarismo (não confundir com comunismo, perspetiva política diferente e que aqui não abordamos) de Sandel ataca, pois, a posição original, já que defende que a comunidade precede a pessoa. Só há pessoas concretas, em comunidade, portadoras de uma conceção de bem que resulta da cultura dessa comunidade. Assim, Sandel aceitará os princípios de justiça de Rawls, mas discordará, por um lado, da metodologia filosófica que a eles conduz e, por outro, da prioridade dada ao princípio da liberdade.

quinta-feira, 15 de abril de 2021

«À Porta da Eternidade» - filme recomendado

À Porta da Eternidade: Antes de se dedicar à pintura, o holandês Vincent Van Gogh teve uma breve carreira como pastor evangelista. Em Paris, para onde se mudou em 1886, cruz

sábado, 13 de março de 2021

#14 - KANT VS MILL NUM SLIDESHOW MÍTICO | ui, aproxima-se o exame de Fil...



Vamos, de forma breve, ver quatro diferenças entre as éticas de Kant e de Stuart Mill.

Diferença nº 1: metafísica vs. naturalismo
O imperativo categórico kantiano expressa uma lei moral que, de acordo com o filósofo, a nossa razão pode descobrir em si mesma antes de qualquer dado da experiência. O ponto de partida de Kant é metafísico, palavra grega que significa para além da física. A razão pura que há em cada um de nós descobre, por si mesma, a lei moral. Pelo contrário, nada disto interessa a Stuart Mill. Para o nosso amigo britânico, um firme naturalismo deve presidir ao nosso pensamento: o ser humano não está acima da natureza, mas faz parte dela. Uma proposta ética funcional deve basear-se nas experiências concretas do ser humano.

Diferença nº 2: motivos vs. consequências
De boas intenções está o inferno cheio, diria Stuart Mill, pensador consequencialista. Para este filósofo que foi também funcionário da Companhia das Índias Orientais Britânicas, o critério de uma boa ação reside nas consequências que a mesma gera e, dentro destas, o que se pretende é a felicidade geral. Pelo contrário, para Kant, o critério de uma boa ação reside nos motivos da ação. E apenas um motivo é verdadeiramente moral: o puro respeito pelo dever - por isso se trata de uma ética deontológica.

Diferença nº 3: razão vs. sentimento

Para Kant, homem tão pontual que as senhoras da sua vila acertavam o relógio pela hora a que ele dava o passeio depois da sesta, razão e sentimentos são bem diferentes e a ética exige a vitória da razão. É o domínio racional dos nossos interesses e instintos que conduz a uma vida ética. Ser ético é ser racional. Ao invés, para Mill, a razão tem um papel de cálculo e de balanço mas a finalidade ética por excelência é a felicidade que, sobretudo para os hedonistas, é um sentimento.

Diferença nº 4: regras morais absolutas vs. regras morais que admitem exceções

O imperativo categórico leva-nos a que as regras morais representadas por máximas universalizáveis sejam absolutas: não há exceções. Pelo contrário, o princípio da utilidade faz com que as regras morais dele derivadas possam encontrar exceções. Numa situação invulgar em que não saibamos muito bem como aplicar a regra ou em que haja, até, uma contradição entre regras morais, suspender excecionalmente uma regra moral pode conduzir a uma maior felicidade geral, argumentam os utilitaristas.

ÉTICA UTILITARISTA DE STUART MILL


Vamos nesta descrição destacar quatro críticas que podem ser feitas à proposta ética de Stuart Mill, o utilitarismo.
O utilitarismo legitima distribuições desiguais
Imaginemos duas educadoras de infância que decidem fazer um bolo para a turma de cada uma delas. A Educadora de Infância da turma A faz um bolo banal, mas estima bem as quantidades e todas as crianças comem bolo, ficando moderadamente agradadas. A Educadora da turma B faz um bolo verdadeiramente excelente, mas engana-se nas quantidades e apenas dois terços da turma comem bolo, ficando contudo em verdadeiro êxtase, pois trata-se do melhor bolo que aquelas crianças já comeram na sua curta vida. Ora, o acréscimo de felicidade geral parece ser maior na turma B; contudo, a distribuição mais igualitária é na turma A. O esquema de pensamento utilitarista parece falhar ao não ter em conta critérios de equidade no seu cálculo da felicidade geral.
O utilitarismo permite o sacrifício das minorias
Imaginemos uma aldeia em que 95 % da população ganha a convicção profunda – mas falsa – de que os 5% da população que têm olhos verdes são um clã secreto de feitiçaria violenta. Ora, para os 95% da população, a felicidade só poderá ser alcançada se forem sacrificados os 5% da população que a referida maioria receia. A prioridade dada à felicidade geral, sem cláusulas de salvaguarda, faz com que o pensamento utilitarista pareça permitir o sacrifício de minorias em prol de maiorias.
O utilitarismo exige uma imparcialidade excessiva
A moralidade de uma ação, para o utilitarismo, fixa-se nas suas consequências. Isto envolve um cálculo. Ora, se queremos usar o utilitarismo na vida concreta, este cálculo assume um caráter previsional. E é precisamente aqui que pode estar sujeito ao erro, pois muitas vezes pensamos que as consequências da nossa ação vão ser umas, verificando-se depois consequências imprevistas.
Imaginemos um carro em que circula uma família de três pessoas. De súbito, o/a condutor/a apercebe-se de que, mesmo à sua frente, uma família de cinco pessoas atravessa a rua. O/a condutor/a percebe que não conseguirá travar a tempo; mas, se se desviar, bate contra uma parede, colocando em risco os que vão no automóvel. A perspetiva utilitarista recomendará, aqui, a salvação da família de cinco pessoas, meramente porque são mais – mas não será demasiado exigente ignorar critérios como a lealdade e a proximidade afetiva?
O utilitarismo pressupõe um cálculo muito difícil
A moralidade de uma ação, para o utilitarismo, fixa-se nas suas consequências. Isto envolve um cálculo. Ora, se queremos usar o utilitarismo na vida concreta, este cálculo assume um caráter previsional. E é precisamente aqui que pode estar sujeito ao erro, pois muitas vezes pensamos que as consequências da nossa ação vão ser umas, verificando-se depois consequências imprevistas.